Abri a gaveta da pequena cômoda do meu quarto na casa dos meus pais a procura de um remédio, desses de desentupir o nariz, quando vi, lá no fundo, aquela coisa sem forma, amarelada pelo tempo e vívida na minha memória.
Foi o coração que ordenou que a pegasse e eu obedeci. Tomei-a em minhas mãos com cuidado, pois tratava-se de uma relíquia. Minha fraldinha. Diferenciava-se das demais por seus desenhinhos azuladinhos de menininhas, tudo no diminutivo, para combinar com sua função, ora tão importante, de ter sido minha naninha.
Acompanhou-me por tanto tempo... Esteve comigo em todas as vezes que enchi a cara de leite com chocolate na mamadeira de bico de borracha marrom. Embalou muito do meu sono pesado repousando tranquila ao meu lado. Testemunha de uma infância, essa nana.
Nossa relação era um tanto abusiva, é verdade. Gostava de passá-la no pé para que sua suavidade me provocasse pequenas cosquinhas. Para ela, uma humilhação estar o tempo todo ali, nos pés sujos de uma criança do interior. Mas eu compensava seu sofrimento com uma fungada em suas dobrinhas. Um pouco de pé, um pouco de cheirinho. Um morde e assopra diário, que me entorpecia.
Eu pertencia a ela.
Ela pertencia a mim.
Agora ela estava novamente em minhas mãos. Sua aspereza entregava sua idade. Seus rancores. Fora abandonada e voltava agora, como se para se vingar.
E eu sabia que não deveria abusar-lhe novamente, mas não resisti. O coração ainda coordenava meus movimentos, bloqueando qualquer razão que pudesse me impedir de levá-la ao nariz, para um último cheiro. O cheiro da morte. Engasguei-me. Espirrei. Espirrei mais uma vez. Mais trinta vezes. O remédio de desentupir o nariz não foi suficiente para controlar a situação. Precisava de um antialérgico de alta dosagem. Abandonei a fraldinha de volta na gaveta e quase consegui enxergar sua satisfação. Estava vingada.
E o marketing, Andrea Cristina?
Faz tempo que não crio uma coluna sobre marketing por aqui. Sei que prometi escrever a cada 15 dias, mas não tenho conseguido. Ater-me às crônicas é mais forte do que eu. Talvez por conta de um desejo subconsciente de separar as minhas duas profissões (escritora e “marqueteira”) definitivamente. Engraçado como essa newsletter começou sendo uma coisa e se tornou outra. Assim como eu mudei também ao longo dessas 136 edições.
Pensei seriamente em fazer uma segunda newsletter para falar de marketing, mas isso também não me empolga taaaaanto assim.
Difícil mudar o rumo, sabia?
Em marketing, mudar o direcionamento de uma marca é bem complexo. Tudo é baseado em muito estudo, um diagnóstico completo da situação atual, pesquisa de público e mercado, análise da concorrência, etc.
E na escrita criativa?
A mercadóloga que existe em mim diz: “não muda que você vai perder público", mas a artista grita de volta: “faça à sua maneira".
Resolvi escutar a artista.
Não digo que o marketing nunca mais vai aparecer aqui. Aposto que vai - e muito (especialmente agora que dicidi não incluir a coluna, tenho certeza de que vou querer escrever sobre isso. haha) mas agora a vez é da literatura, das crônicas, das opiniões não solicitadas, do humor, da experiência e da criatividade.
Peço desculpas a quem me acompanha pelo marketing. Espero que você continue por aqui. Prometo lhe proporcionar uma boa leitura.
:)
Notícias do Engravidei
Veja que legal que foi o lançamento na Martins Fontes e anote a data dos próximos eventos.
📆 Agenda:
De 25 a 27 de julho: estarei no Encontro de Autores do Clube Paineiras do Morumby, em São Paulo
Dia 01 e agosto, às 12h: autógrafos no estande da com.tato na Casa Escreva Garota, na FLIP, a Feira Literária de Paraty, às 12h.
Dia 02 de agosto às 10h: vou participar da mesa “O que desperta a sua criatividade?” na Casa Caravana, também na FLIP.
Vejo você em algum desses eventos?
Não aprendi dizer adeus
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Mas deixo você ir
Estou em Jau, na casa dos meus pais. Essa é nossa única viagem de férias. Mas nós vivemos em uma bolha em São Paulo e os amiguinhos das crianças estão todos viajando para lugares incríveis. Com receio, falei com eles, no início das férias, sobre nosso destino ser “apenas" a casa da vovó e eles vibraram de alegria. Contaram os dias até pegarmos a estrada. E eu estou aqui, feliz da vida, pensando em como sou sortuda por meus filhos terem gostos simples e curtirem tanto a companhia dos avós.
Até semana que vem!
Um beijo,
Andrea
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andrea eu dei muita risada aqui, imagino a naninha acumulando décadas de ácaro, esperando cuidadosa o momento certo de se vingar. e obrigado pelo link <3
Aaaaah, obrigada!