#147 - Enquanto chove em Barcelona
Notas sobre pausa, viagem e fôlego
Chove em Barcelona. Eu vejo a chuva por entre as linhas horizontais da persiana do apartamento que alugamos em Pesseig de Grácia. Ouço o som de seu despejar, tão igual a qualquer lugar do mundo. Em qualquer lugar do mundo os carros passam por poças fazendo chuá. Pessoas andam com pressa, desviando de poças. Turistas, como eu, olham para o céu e perguntam-se se a chuva vai parar em algum momento.
Você não é de açúcar, diria a minha mãe. Sai da chuva para não se resfriar, diria a mesma senhora. Eu, sem saber se vou ou se fico, decidi ficar. Um dia sem bater perna loucamente não me fará mal. Ao contrário, é um respiro necessário numa viagem longa, ainda mais com marido e crianças a tiracolo.
A chuva cai em Barcelona e eu respiro no apartamento. Que excelente ideia ter alugado um apartamento ao invés de confinar a família em um hotel. Aqui, todos respiram um pouco. Temos espaço. É importante ficar junto, mas é importante nos separarmos também.
Eu respiro em Barcelona quando estaria pirando no Brasil.
Fim de ano me enlouquece tanto, que virou assunto de crônica aqui (acabei de ler, está engraçada), aqui (uma crônica atemporal) e na newsletter passada, que reflete bem a situação da minha mente antes de viajar.
No Brasil, acompanhando os grupos das mães da escola, eu estaria doida. Atrás de lembrancinhas. Da comida para o lanche coletivo. Me desdobrando para buscar a criança mais cedo no último dia. O dia em que os pais vão até a sala buscá-los. E eu não quero que meus filhos sejam as únicas crianças que ficam para o período vespertino.
Tenho a impressão que as férias neste período (que nunca foi de férias pra mim), foi uma fuga para respirar. Coloquei a cabeça fora do buraco e enchi o pulmão de ar. Segurei este ar por um tempo e o soltei com a boca bem aberta, liberando um aaaaahhhhhh bem sonoro, que me ajudou a relaxar os ombros, desgrudar a língua do céu da boca e desfranzir o cenho.
Outro dia fui fazer uma aula de yoga e a professora repetia o tempo todo que sem respirar não chegávamos a lugar nenhum. Verdade. Não dá para executar as posturas que comprimem o abdômen sem expirar. Nem as que abrem o peito sem inspirar.
Quando movimento e respiração não andam juntos, o corpo trava. Falta ar. Falta fluidez. E aí, o que era para ser meditativo se torna exaustivo. Igualzinho fora do tapete.
Na yoga, assim como na vida, a respiração é a âncora do movimento e da mente. É com ela que centra no momento presente, se concentra no que se está fazendo e se controla a energia e o relaxamento.
Aliás, falando em energia, meu professor de tênis vive chamando a minha atenção porque coloco energia demais em lugares que não preciso, que só vão me cansar mais rápido. Alguma semelhança com o cotidiano não é mera coincidência. Quantas vezes a gente dedicou esforços para coisas pequenas? Quantas vezes sofremos por pouco? Quantas vezes, depois de gastar energia à toa, a gente não olhou para trás e disse “nossa, por que me estressei tanto com isso"?
Essa reflexão será boa para o próximo ano.
2026, ano de eleição.
De textão nas redes sociais.
De gente brigando por política no WhatsApp.
Energia demais em algo que não compensa o desgaste. Porque não dá para ter conversas profundas em redes sociais rasas. Ainda mais quando a chance de sermos atacados por quem a gente nem conhece é enorme.
Faço aqui minha mea-culpa. Já me desgastei por isso.
Hoje em dia, aprendi a respirar.
Chove em Barcelona, eu respiro dentro do apartamento e acalmo a energia angustiante dispendida em pensamentos como “você está descansando em euros, Andrea Cristina", “você deveria estar batendo perna, Andrea”.
Expiro, solto os ombros e olho pela grande janela do apartamento. Vejo as janelas antigas, os tijolinhos dos prédios vizinhos.
Sinto-me em um filme.
Um daqueles bem bobinhos. A mocinha é uma escritora. Está em seu apartamento na Europa ou em Nova Iorque. Escreve o livro que não conseguia terminar.
Agora consegue. Depois de tudo o que viveu nas últimas semanas, encontrou seu rumo.
A câmera então se aproxima agora da tela do computador da protagonista e o público consegue ver as últimas palavras sendo digitadas:
Depois da chuva, quem tomará o rumo sou eu. Enquanto isso, deixo chover.
Fim.
Não aprendi dizer adeus
Não tenho consumido quase nada de conteúdo nos últimos dias, mas tenho aprendido algumas coisas interessantes sobre a cultura e as tradições de Natal aqui da região da Catalunha:
1. Caga Tió
Uma delas é a do Caga Tió. Trata-se de um tronco de madeira com carinha feliz, gorro vermelho (barretina) e que, nas casas, fica coberto por um cobertor.

Com ajuda do ChatGPT descobri mais sobre ele:
O que ele faz?
Na véspera ou no dia de Natal, as crianças batem no tronco com paus, cantando uma música tradicional, para que o Caga Tió… “cague” presentes 🎁
Normalmente doces, chocolates e pequenos brinquedos.
Como funciona a tradição
No início de dezembro, o tronco “chega” à casa. As crianças o alimentam todos os dias com frutas ou restos de comida, e o cobrem, para que não passe frio. No Natal, vem o ritual: música, pauladinhas e presentes surgem debaixo do cobertor
Essa é uma tradição ligada a rituais antigos de fertilidade, abundância e renovação. O humor escatológico veio depois, como uma camada extra de identidade catalã: irreverente, irônica e zero solene.
2. El Caganer

El Caganer é um bonequinho agachado, de calças abaixadas, discretamente fazendo cocô… dentro do presépio!!! Geralmente fica escondido entre arbustos, atrás de uma árvore ou no cantinho mais improvável da cena do nascimento de Jesus. As crianças adoram brincar de procurá-lo nos presépios.
Pesquisei se isso não era uma ofensa ou uma provocação e meu amigo Chat GPT disse que não. Ele simboliza fertilidade, prosperidade e boa sorte para o ano que começa. Faz sentido, pois ele despeja adubo no chão e toda vida precisa de um solo fértil para seguir adiante.
No fim, ele cumpre um papel quase filosófico, trazendo o sagrado para perto do cotidiano e lembrando que, mesmo nas cenas mais solenes, todo mundo continua humano.
Normalmente ele usa a clássica barretina vermelha, camisa branca e calça escura, mas hoje, ganhou mil versões: políticos, jogadores de futebol, cantores, personagens famosos e até Papai Noel.
Não chega pro Natal, mas é um bom presente
Eu poderia ter usado qualquer expressão mercadológica tradicional dessa época natalina aqui para tentar lhe persuadir a comprar o Engravidei, meu livro lindo, que lancei este ano. Mas preciso ser sincera, o prazo de entrega da editora não ajuda o calendário de compras de última hora.
Porém, o Engravidei é um livro que vai agradar qualquer mãe. Nele, juntei narrativas íntimas da minha primeira gestação com reflexões atuais. O resultado é um retrato sincero, divertido e comovente da maternidade.
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Mas deixo você ir
Não sem antes dizer que essa newsletter vai sair de férias e volta em janeiro, agora quinzenalmente, mas com o olhar atento e um tanto irônico do cotidiano que você já conhece.
Aproveito para agradecer de coração por você estar aqui comigo e para desejar a você e sua família um fim de ano de luz, amor e alegria.
Até a próxima!
Um beijo,
- Andrea



Estamos quase vizinhas no momento rs
Andreas na Espanha
Boas festas & férias de Andalucía
Ah! Passei boa parte da minha vida adulta/mãe viajando no Natal. Além das lindezas festivas de outras cidades/países, eu precisava me distanciar dessa loucura de final de ano, a tal dezembrite, né? Que vcs aproveitem bastante esse tempo juntos, sem correrias, obrigações e listas pra ticar, mas com muitas pausas, respirações e amor descansado.
Boas festas, querida.