Meu bebê mais velho faz 9 anos hoje e eu me pego aqui, sem saber lidar muito bem com algumas de suas novas questões existenciais. Uma delas e a mais recente: Rafael não quer festa de aniversário com mais de quatro amigos. Quem vem pro “bolinho” aqui em casa hoje é só quem ele acredita que vai respeitar sua vontade em não ter o terrível, o embaraçoso, o temível hino das trevas chamado Com Quem Será?, ao final do Parabéns a Você.
Ele tampouco quis bolo na escola, pelo mesmo motivo: medo do Com Quem Será.
O que será que o atormenta?
Tentei abordá-lo sobre o tema de diversas maneiras. Perguntei se era porque ele não queria que sua paquera (crush, sei lá), descobrisse sua admiração.
- Eca, mãe! Não!
Perguntei se era porque a menina cujo nome ecoasse das vozes brincalhonas dos amigos sarristas seria induzida a acreditar que seu amor por ela é verdadeiro, quando, na verdade, não é.
- Isso também.
Perguntei então o que o afligia.
- Vão ficar me zoando o dia inteiro.
- Só se você ligar.
Existe uma ciência amplamente estudada por trás das transgressões da infância. Os estudos comprovam: se você se importa com a zoação, você está ferrado.
Isso vem dos mesmos estudiosos de “o apelido só pega em quem os odeia”.
Quando eu tinha mais ou menos a idade dele, ia todos os dias pra escola com um moletom vinho. Logo começaram a me chamar de “betê”, diminutivo de beterraba.
Não liguei. Respondia com um sorriso. O apelido não pegou.
Na sétima série, ao exibir um novo corte de cabelo pra minha amiga e ouvir que estava lindo, perguntei a ela, em tom de brincadeira, se estava igual à Julia Roberts. Algum idiota da sala ouviu e eu comecei a ser recepcionada na sala, não importa se na volta do banheiro, do intervalo ou após responder alguma pergunta do professor, por pré-adolescentes batendo na carteira e gritando “Julia Roberts - pá-pá-pá".
Ridículos.
Mais uma vez, não liguei e logo a provocação parou.
Preciso dizer que se fosse escolher uma atriz pra me representar num filme sobre a minha vida, sem titubear diria: Julia Roberts.
Voltando ao Rafael, além de não querer bolo na escola, Parabéns a Você com Com Quem Será, festa em casa e etc, ele me pediu de presente um jogo de Nintendo Switch.
Nada contra. Um presente é um presente. Mas o presente veio de uma maneira tão sem graça… Uma semana antes do aniversário, ele me pede:
- Mãe, posso comprar meu presente?
- Já?
- Ah, já, porque quando meus amigos vierem jogar no meu aniversário, eu já quero saber mexer no jogo, já ter umas recompensas.
- Então tá.
Meu cartão de crédito está cadastrado na conta da Nintendo, ele só clicou em comprar. Não teve papel de presente barulhento e brilhante, fitas para desamarrar, pacote difícil de abrir, desses que fica mais difícil de acordo com nossa ansiedade… nada.
Fiquei pensando se isso não é estratégia para que eu lhe dê mais alguma coisa, uma vez que eu não senti que o presenteei. Igual a gente não sente que gasta até chegar a fatura do cartão. Uma ilusão.
Tomada por essa inquietação, entrei ontem à noite na Amazon e encomendei dois livros pra sua idade. Depois de me assegurar da entrega no dia seguinte e clicar em comprar, contei feliz:
- Mamãe te comprou mais dois presen-teees!
- Sério? O que é?
- Dois livros. Mas você só vai saber quais são quando receber.
- Ah…
- Que foi?
- Preferia uma meia.
Feliz aniversário, filho.
Pokemon, um micro estudo de caso.
O jogo-presente-de-aniversário que o Rafa me pediu foi um do Pokemon.
- Mas você já não tem o jogo do Pokemon?
- Esse é outro.
Eis que, pra minha mãe, o mesmo - pelo menos me pareceu o mesmo - pedido: um jogo do Pokemón.
- Mas você já tem.
- É outro.
- Eu te dei outro.
- Mas é outro.
Caramba. Se tem uma coisa que se reinventa é Pokemon. Toda hora tem uma coisa nova da franquia surgindo por aí.
Pokémon foi lançado no Japão em 1996 e é uma marca extremamente popular até hoje. São 27 anos de relevância e crescimento, com mais de mil personagens, que hipnotizam milhões de pessoas em episódios de animes, filmes, cartas, lojas oficiais, pelúcias, histórias em quadrinhos, jogos de videogame e muito merchandising.
Em termos de marketing, temos muito a aprender com a história do Pokemon. Embora não seja uma conhecedora profunda, como mãe de uma criança de 9 anos, consigo identificar algumas características que fazem dessa uma marca tão forte:
Nostalgia, afinal, a franquia tem quase 30 anos. Mas não é só isso. Pokémon cresceu junto com seus usuários e hoje faz parte de seu cotidiano. É a primeira marca de jogos tradicional a abraçar totalmente os dispositivos móveis com um novo tipo de jogo, baseado em geolocalização e em realidade aumentada.
Consistência. Não interessa se você apenas assiste os animes, você vai ter o mesmo repertório que quem, por exemplo, só joga Pokemon GO.
Comunidade. Seja para caçar virtualmente ou pra trocar cartas físicas, Pokemon tem uma comunidade engajada e viciada em colecioná-los.
Transmídia storytelling: contar história em diversas mídias. São jogos de cartas, celular, consoles, realidade aumentada, quadrinhos e anime.
Mercado com risco médico de novos entrantes e substitutos. Num mundo como o de games, em que temos sempre novos entrantes e substitutos de um jogo de sucesso por outro, o Pokemon tem sua história como vantagem competitiva.
Pokemóns agradam diferentes faixas etárias. Para crianças pequenas, é apenas um jogo de criaturas fofas com poderes únicos lutando entre si. Conforme as crianças vão crescendo elas vão se especializando nas estratégias e se interessam em serem especialistas em capturá-los, evoluí-los, colecioná-los e trocá-los. No caso do meu filho ainda tem um super benefício intangível: ele é especialista em algo que eu não entendo quase nada.
Não aprendi dizer adeus
Esse jogo de fazer dormir o Rafael não quer, né?
Vou te contar, viu?
Mas deixo você ir
Porque tenho que comprar granulado.
Até a próxima semana!
- Andrea
Vivaa o Rafa!! ❤️ Acho q quem esta com receio do “com quem sera” eh vc?! 😂