#146 - Macaquinhos no sótão
Bem-vindo à newsletter que quase não nasceu
Chegou aquele momento que eu tanto temia. O momento do “não consigo criar nada". Newsletter parada há quase 3 semanas… Um desrespeito com os leitores, eu sei. Me desculpe. Mas, peraí, não era pra ser algo informal? Despretensioso? Inclusive, essa newsletter é gratuita justamente para tirar você, Andrea Cristina, da pressão. Então por que sentes assim, tão pressionada?
Bloqueio criativo. É isso que vem à minha mente para, logo em seguida, ser desmentido pela lembrança de uma Flip em que Noemi Jaffe afirmou, com todas as letras que bloqueio criativo não existe.
Culpa, culpa, culpa.
Chibatadas e mais chibatadas nas costas.
Por que se cobrar assim, Andrea Cristina?
Felizmente sou salva por outra lembrança. A de Andrea Del Fuego, rebatendo à questão de bloqueio criativo da maneira que mais me representa e que, quem sabe, pode ser o fio condutor dessa newsletter:
— Você tem bloqueio criativo, Andréa?
— Eu tenho é família.
Eu tenho é família.
Eu. Tenho. É. Família.
Pegaram?
Minha família ocupa não apenas o meu tempo, mas como quase todo espaço da minha cabeça, como macaquinhos pulando no sótão (hello, Menino Maluquinho!). Eles pulam e eu esqueço coisas. Pulam e eu vou à uma consulta no dia errado. Pulam e eu esqueço de mandar o presente para a festinha de aniversário. Pulam e eu perco o celular.
Aliás, perder o celular já é default.
As crianças dizem que vão criar um reality show no YouTube chamado “mamãe perde tudo", mas o tudo que eles se referem é, na maior parte das vezes, o celular.
Costumo até dizer que uma viagem só é boa quando eu perco o celular. Aconteceu assim nas últimas - sei lá - três viagens.
Em uma delas, no Japão, deixei o celular no banco do metrô. Era ainda o primeiro dia e eu poderia muito bem culpar o fuso horário, se isso não fizesse parte de quem eu sou. Por sorte era o Japão e um japonês desceu correndo atrás de mim para me entregar. Foi a melhor viagem da vida.
No ano passado, desembarquei com a família em Miami e deixei o celular no bolso em frente à poltrona do avião. Percebi apenas quando estávamos na fila da imigração. Vou voltar, falei e saí em direção ao corredor por onde viemos.
Sim, eu reparei que estava escrito “do not enter” em caixa alta, bem grande, bem acima da minha cabeça, bem na entrada do corredor, mas fingi que não vi. Saí correndo no sentido proibido. Cheguei na porta do avião e os comandantes já estavam desembarcando. A equipe americana de solo já estava dentro da aeronave. Ninguém mais entra quando eles tomam conta.
Please, please, please, supliquei.
I'm sorry, desculpe moça, mas não.
Nem o comandante pode pegar pra mim?
Nem.
Nem alguém da sua equipe?
Não, desculpe. No, no, no. Procure a companhia aérea depois.
Encolhi os ombros, soltei um ok bem desanimado e estava virando nos calcanhares quando…
Excuse-me?
Yes?
Este é seu telefone?
Uma moça - anja - da equipe americana aparecia atrás da chata que me dizia no, no, no, com meu celular em mãos. Ela o levantou e eu pude ver a foto dos meus filhos brilhando na tela bloqueada.
YES! É meu telefone!
Saí correndo com o celular em mãos, de volta pelo mesmo corredor, agora no sentido permitido, para encontrar marido e crianças sentados, levando uma dura de uma agente da polícia federal americana. Eles não deviam ter me deixado voltar.
Sorry, gente.
Adivinhem só, a viagem foi maravilhosa.
Vamos voltar no tempo?
O ano era 2008. Eu tinha um celularzinho Motorola vermelho, de abrir e fechar. Estava fazendo um mochilão pela Europa e, no único taxi que peguei na viagem inteira, deixei o telefone. Este eu nunca mais recuperei, mas nessa viagem conheci meu marido.
Entendem porque eu perder o celular já é parte do meu comportamento padrão?
Mas vamos ao bloqueio criativo e aos macacos no sótão.
Você já teve essa impressão? De ter muita coisa na cabeça, ter mil ideias e não conseguir organizá-las direito? Ou sem saber onde elas foram guardadas? Às vezes penso, vou escrever sobre tal coisa. Aí a tal coisa se perde numa pilha de rascunhos e documentos não arquivados do meu cérebro. Parece que consigo ver a bagunça lá em cima. A pilha de papéis é tão grande quanto a montanha de cartas do Xou da Xuxa. E ainda tem macacos pulando em cima dela.
Seria o fim de ano? A quantidade de informação que a gente recebe todos os dias? Ou só a carga mental de uma mulher, mãe, esposa, trabalhadora brasileira mesmo?
Não sei. Só sei que não cabe mais nada lá em cima. Nada. Está tudo abarrotado. Estou escolhendo, inclusive, com o que me preocupar. Um exemplo? Mamãe desabafou que meu pai anda comendo muito doce, o que é altamente prejudicial à sua saúde. Ela estava realmente preocupada, procurando alguma ajuda ou alguém para se preocupar junto com ela. Respondi que a escolha é dele e não tem o que fazer. Fim. Não tenho como ajudar, então descarto.
Passei de fria, tenho certeza. Mas não cabia mais nada na minha cabeça, seria apenas uma preocupação sem solução para me paralisar.
Comentei sobre essa sensação de cérebro cheio e bagunçado na terapia da semana passada e a terapeuta usou uma expressão que faz todo sentido: pensar em círculos.
Eu fico pensando em círculos. Meus pensamentos giram, giram, giram e não me levam a lugar nenhum. Não é à toa que os ombros estão quase grudados nas orelhas de tanta tensão. Pensar em círculos, como você deve imaginar, gera ansiedade. A gente foca na produtividade, mas o pensamento circular não nos permite produzir.
Calma, Andrea Cristina.
Calma, você também que passa por isso (dezembro deve ser o mês do pensamento circular).
Tem solução, me disse a terapeuta.
Qual?, perguntei incrédula.
O nada.
O nada?
Buscar o silêncio, ela disse, mas não como um monge no alto de uma montanha no Tibet. Um silêncio externo e interno. Sair do meio do caos do dia a dia para acalmar a mente. Entrar em uma biblioteca e não fazer nada, por exemplo, apenas contemplar. Olhar pela janela sem buscar nada específico do lado de fora. Tirar o “ter que” em alguns instantes do nosso dia para buscar o nada.
Tipo homem, sabe?
Às vezes você está ao lado de algum homem e ele está lá, em silêncio. Aí você não resiste e pergunta o que ele está pensando.
Em nada
Como assim?
Não estou pensando em nada.
Não é possível.
Sim, é possível. Acredite nele. Homens, por algum motivo conseguem pensar em nada. Isso provavelmente deve-se à diferença das sinapses cerebrais das mulheres e dos homens. O cérebro do homem é como um depósito cheio de caixinhas organizadas: ele abre uma de cada vez e fecha antes de pegar a próxima. Já o da mulher funciona como uma bola de fios que se mexe sozinha — tudo puxa tudo, e tudo acontece ao mesmo tempo. Já falei sobre isso em uma newsletter sobre neuromarketing, há quase cem edições atrás (caraca!).
Por isso, mulheres tem uma dificuldade tremenda para conseguir entrar na caixinha do nada. E também para lidar com quem consegue, eu diria. Vamos combinar que é irritante?
Mas por que viemos parar aqui mesmo?
Ah, sim, bloqueio criativo. Bom, parece que me resolvi, não é? Taí um texto novo em folha na sua caixa de e-mail. Um texto um tanto confuso, é verdade, mas sinto que o círculo está começando a se transformar numa reta. Espero que as próximas palavras que você receber dessa autora que vos fala sejam coerentes umas com as outras. Se não forem, já sabe, estou novamente nos círculos. Aproveite e me dê um toque. Diga-me para focar no nada. Mas deixe o comentário por aqui ou por e-mail, porque provavelmente vou ter perdido o celular.
Ufa! Bem-vindo, dezembro.
Não aprendi dizer adeus
Tenho uma mania de mandar para mim mesma os links das coisas interessantes que leio durante a semana, justamente para compartilhá-las com você aqui nesta seção da news. Mas, com a cabeça rodando em círculos, não tenho saído muito do lugar. A prova disso está nas únicas coisas que me mandei ultimamente:
Bom dia dezembro, bom dia Mariah Carey, bom dia meme da Mariah Carey.

Dica do dia: Ao planejar as especificações do seu design de embalagem, considere cuidadosamente onde os recortes serão feitos. (Depois de ver, você não consegue mais desver).
É isso, Brasil.
Sem me esquecer de sempre indicar as newsletters das amigas. Vale a pena ler, que as meninas arrasam.
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Mas deixo você ir
Depois de tanto pensar em círculos, acabei escrevendo em zigue-zague. Juntei um assunto no outro, contei histórias de celulares perdidos e de desabafei a ansiedade. Então, se você chegou até aqui, tenho duas coisas para lhe falar:
Parabéns.
Obrigada.
Nos vemos na próxima edição!
Um beijo,
Andrea Nunes
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Tô do mesmo jeito, Andréia, mas...moro sozinha. Devo me preocupar?😂
que histórias maravilhosas dos celulares perdidos! mas deve ser bem tenso enquanto os fatos estão se desenrolando...